Não partas já.Fica até onde a noite se dobra
para o lado da cama e o silêncio recorta
as margens do tempo.É aí que os livros
começam devagar e as cores nos cegam
e as mãos fazem de norte na viagem.Parte apenas
quando amanhã se ferir nos espelhos do quarto
em estilhaços de luz;e um feixe de poeiras
rasgar as janelas como uma ave desabrida.
Alguém murmurará então o teu nome,vagamente,
como a gastar os dedos na derradeira página.
E então,sim,parte,para que outra história se
invente mais tarde,quando os pássaros gritarem
à primeira lua e os gatos se deitarem sobre
o muro,de olhos acesos,fingindo que perguntam.
Maria do Rosário Pedreira
Foto da web
Haverá sempre esta cama onde me deito
a luz que espreita sob o abajour
e se reflecte na parede branca...
Porque será então que não me vejo?
Foto da web
O meu amor é como um barco na tormenta
tanto busca o absoluto
na crista da mais alta onda
como mergulha no negrume
dum mundo feito de silêncio e sombra.
Mas lá no fundo desse mundo
há peixes coloridos e muitos, muitos limos
e no meio desses limos,
o mar é mais verde e mais fecundo
e é lá que eu vou ficar
à espera de sonhar...
sonhar que sou um lindo peixe verde
com um brilho luminoso no olhar
e no peito uma vontade imensa de acreditar.
Imagem encontrada na net
Neste começo de 2011, em que nos são vaticinadas tantas dificuldades, nada melhor que este belo poema de Miguel Torga, para nos incutir um pouco de ânimo e esperança!
Recomeça...
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
o logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...
Miguel Torga
Imagem encontrada net.